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A história da Honda na Fórmula 1. Do Japão para o mundo

Honda RA301

Para muitos, falar da história da Honda na Fórmula 1 passa, invariavelmente, por recuar até à década de 80. Uma época em que os motores da marca nipónica dominavam e impulsionavam lendas como Alain Prost, Nigel Mansell e o incontornável Ayrton Senna até à bandeira de xadrez. Uma história com cheiro a octanas e um intenso sabor a vitória. Mas nem sempre foi assim…

Hoje recuaremos até ao primeiro capítulo desta aventura. Queremos ir mais longe. Queremos recuar até à década de 60, altura em que Soichiro Honda, fundador da marca com o mesmo nome, desafiou os engenheiros da mais jovem marca de automóveis japonesa a enfrentar os «gigantes» do Mundial de Fórmula 1. Aquele que é, sem dúvida, um dos capítulos mais inspiradores e audazes da história da Honda e da histórica liderança de Soichiro Honda.

A chegada da Honda à Fórmula 1

Apesar de a entrada da Honda na Fórmula 1 ter sido anunciada oficialmente em janeiro de 1964, esta aventura começou muito antes.

Desde 1962 que a marca de Hamamatsu trabalhava afincadamente no seu projeto de Fórmula 1. Ou seja, apenas um ano depois do lançamento do seu primeiro automóvel de produção, a Honda já desenvolvia um monolugar para a categoria rainha do desporto automóvel.

RA270 Soichiro Honda

A decisão alinhar na Fórmula 1 partiu, como seria de esperar, do próprio Soichiro Honda. Uma decisão corajosa — arriscada até… — ou não estivéssemos nós a falar da mais competitiva prova do desporto automóvel mundial.

Acresce ao risco — e à coragem — desta decisão, o facto da Honda ser a mais jovem marca automóvel japonesa, e a primeira marca japonesa a alinhar no Mundial de Fórmula 1. Para esta aventura, Soichiro Honda contou com o apoio fundamental de dois elementos da estrutura da Honda: Hideo Sugiura, diretor de qualidade na fábrica de Saitama, e Yoshihito Kudo, diretor do centro de desenvolvimento e pesquisa da marca.

Fórmula 1 à maneira da Honda

Soichiro Honda batizou o primeiro protótipo de um Fórmula 1 da Honda com o nome RA270. Reza a lenda que o número 270 diz respeito ao objetivo que o fundador da marca estabeleceu para o primeiro motor de Fórmula 1 da Honda: atingir os 270 cv de potência.

Mas para Soichiro Honda não bastava desenvolver um motor, nem sequer bastava alinhar na grelha de partida. Soichiro queria afirmar a Honda como uma potência global na indústria automóvel.

Foi por isso que a jovem equipa japonesa surpreendeu o mundo ao apresentar um chassis desenvolvido internamente. Algo que apenas a Ferrari e BRM haviam feito até então.

Esboço do interior do RA271

Sem qualquer experiência no mundo da Fórmula 1, a Honda foi beber inspiração ao Cooper Climax, um monolugar que a marca nipónica havia comprado no final de 1961 e que viria a influenciar fortemente o primeiro protótipo de um monolugar da marca.

Os primeiros esboços do motor do RA270 nasceram em agosto de 1962, sendo que em junho de 1963 o propulsor estava pronto a ser testado. Mas tivemos de esperar até 1964 para se concretizar o derradeiro casamento motor/chassis Honda.

O RA270 foi posto à prova pela primeira vez a 6 de fevereiro em Arakawa. Nesse teste alcançou as 8500 rpm em quinta velocidade e os 282 km/h de velocidade máxima. A 13 de fevereiro do mesmo ano, a potência registada ultrapassou pela primeira vez os 200 cv (foram atingidos os 210 cv) sendo que estes resultados eram do agrado claro de Soichiro Honda.

Produção em primeiro lugar

No entanto, nem tudo eram rosas. O desenvolvido do chassis do RA270 estava a colocar imensa pressão na equipa de engenheiro da Honda que, além do programa de Fórmula 1, a equipa dedicava-se também a desenvolver veículos de passageiros. Ora isto obrigava a uma divisão de recursos e causou preocupação a Yoshio Nakamura, diretor assistente do centro de desenvolvimento e pesquisa e futuro manager da equipa.

Uma vez confrontado com estas preocupações, Soichiro Honda indicou a Nakamura que o ideal seria a Honda atuar como fornecedor de motores, incumbindo-o da tarefa de encontrar uma equipa interessada no propulsor nipónico. Após uma viagem à Europa no verão de 1963, Nakamura trouxe boas notícias: a Lotus seria a parceira da Honda.

No entanto, num volte de face repentino, em janeiro de 1964 e a poucos dias de a Honda começar a enviar os propulsores, a parceria colapsou (por razões às quais a Honda foi alheia) obrigando a marca de Soichiro a fazer aquilo que já não contava fazer: construir um chassis para “casar” com o seu motor de Fórmula 1.

O nascimento do RA271

Impulsionada pela queda do acordo com a Lotus, a Honda viria a sofrer com as típicas dores de crescimento associadas a uma “empreitada” tão grande como entrar na Fórmula 1. Assim durante a construção do chassis a partir do zero foram vários os problemas que foram surgindo.

Desde problemas associados ao design do chassis até aos materiais usados passando pelas peças ou componentes, foram vários os desafios que a equipa de engenheiros japonesa teve de enfrentar, muitos deles motivados pelo facto de a Honda ter ainda pouca experiência na produção automóvel. Ainda assim o projeto chegou a bom porto e assim nasceu o RA271.

Honda RA271

Pintado de branco e com uma grande esfera vermelha (numa homenagem à bandeira nipónica), o RA271 assinalava não só a estreia da Honda na Fórmula 1 como a estreia de uma equipa japonesa naquela que já à época era tida como a categoria rainha do automobilismo.

Os desafios de um estreante

Terminado o monolugar, era altura de a Honda se estrear no «grande circo» da Fórmula 1. Quis o destino — e o calendário — que a estreia decorresse no difícil circuito de Nürburgring, na Alemanha, em agosto de 1964.

Os azares começaram logo na qualificação. No primeiro dia, uma afinação da altura ao solo desadequada ao «Inferno Verde» levou a que o cárter do RA271 se partisse. Já no segundo dia, foi a vez de um pistão empenar e entregar a «alma ao criador».

Honda RA271

Isto fez com o que o Honda RA271 pilotado por Ronnie Bucknam partisse do último lugar da grelha de partida. Ainda assim, uma recuperação fantástica — e que atestava as capacidades do monolugar — levaram-no até ao 9º lugar. No entanto, a três voltas do fim o azar voltou a bater à porta e um acidente impediu o RA271 de terminar a prova.

Ao longo desse ano de estreia, a Honda entraria ainda em mais dois grandes prémios, mas não conseguiu terminar nenhum deles. Ainda assim, os ensinamentos dessa estreia viriam a revelar-se fundamentais, com a equipa nipónica a conhecer o sabor do champanhe logo no ano seguinte, no GP do México de 1965, com o RA272 pilotado por Ritchie Ginther.

Honda RA271

A experiência da participação na Fórmula 1

Claramente apostada em usar a Fórmula 1 como «tubo de ensaio» para o desenvolvimento de novas tecnologias para os seus carros de produção, a Honda voltaria a pisar o degrau mais alto do pódio em 1967, com o lendário John Surtees aos comandos do Honda RA301.

Esta primeira aventura da Honda na Fórmula 1 duraria até 1968, ano no qual a marca decidiu retirar-se com uma bagagem cheia de ensinamentos para colocar ao serviço dos seus modelos de produção. Como sabemos, o regresso da Honda à Fórmula 1 aconteceria apenas em 1983, como fornecedora de motores.

Para trás ficou a história de uma jovem marca que ousou enfrentar os «gigantes» da Fórmula 1 e… vencer.

Honda RA301

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